Querido Medo,

Querido Medo,

escrevo para dizer que não temos mais como sustentar essa relação. Você não cabe mais em mim. Hoje, percebo o quanto me perdi em suas falsas promessas, o quanto fui frágil, o quanto de esperanças desperdicei, o quanto de fé minei. Percebo que nossa relação termina aqui. Nossa relação termina aqui. Não que eu não te respeite. Te respeito, e muito. Mas já não te estimo. Já não consigo mais te olhar como se você fosse o meu destino, como se, em você, restasse a minha paz, sonhasse a minha fé. Sinto muito. As coisas mudam. Os sentimentos se transformam. E se ontem eu tanto me agarrei a você, foi por não saber me agarrar ao meu amor por mim. Mas agora sei. E ao descobrir essa possibilidade, descobri que não sei amar tanto a ponto de amar a nós dois, não ao mesmo tempo. Desculpe, não tive opção, entenda, tive de optar. E optei. Por mim. Sinto muito, Medo. Sei o quanto deve estar sendo difícil pra você entender essas palavras. Sei o quanto é difícil perder aquilo que sobre nós se apoia. Perdoe-me. Perdoe-me se, na minha fraqueza, eu precisei usar da sua bengala, clamar por seu apoio. Se hoje te deixo, não é por ingratidão, nem por egoísmo, mas por vontade de felicidade. Você foi e sempre será uma boa lembrança. Não te lembrarei com raiva, não seria tão injusta assim. Você sempre me será lembrado como aquele ensinamento válido, como aquela lição necessária e, por fim, saudável. Se não tivesse existido dentro de mim, eu talvez nunca percebesse a grandeza que é viver sem você, Medo. Eu talvez nunca soubesse o tamanho do prazer que é viver sem sua sombra, sem seu medo de viver. Eu talvez nunca soubesse viver de me ser, sem o medo de me fazer, assim, feliz.  Do fundo do meu bravo coração, obrigada. Sem você eu nunca teria descoberto a fortaleza de minha própria reconquista. Sem você eu talvez nunca teria entendido o significado profundo da palavra superação. Eu precisava da sua sombra em minha vida para saber o que é te vencer de verdade. Eu precisava da sua angústia em minha vida para descobrir como é fácil viver sem te ter. Obrigada, Medo. No fundo, você me foi um grande amigo. Graças a você, eu aprendi que o andar, às vezes, pode ser longe do chão. Graças à sua presença, eu aprendi a olhar para baixo e a encarar, de frente, a beleza do abismo. Nesses anos juntos, eu pude aprender que a melhor maneira de te deixar para trás é me jogando em seu precipício, pois é, na sensação da sua queda, que eu me liberto do seu peso. Ah, Medo, Medo, Medo… Tanto tempo você esteve dentro de mim, e só dentro de mim. Fora, era apenas a expectativa do salto não dado, apenas o escuro sem fantasma. Portanto, obrigada. Obrigada por me ensinar a não te crer. Obrigada por me ensinar que, ainda que os olhos não vejam, há sempre um chão a se caminhar. Se te agradeço, é por seu suspense, por seu terror. Sem sua essência, como eu saberia que a vida também se constrói sobre as faltas? Como eu saberia que a vida também tem seus medos? Mas, felizmente, hoje, eu posso escolher. E escolho te deixar. Escolho me lançar em seu abismo para poder pisar o solo que sempre esteve escondido sob a escuridão de meus pés. Obrigada, Medo. Com alegria, me despeço, alegre por ter aprendido que minha vida não pode ser mais vivida ao seu lado. Alegre, por saber que meus desafios são apenas brincadeiras com solução. Te desejo tudo de bom. Mas agora vou seguir minha vida, feliz, por saber que você vive bem. Bem longe de mim.

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