Mercado Negro

Gostaria de uma nova língua. Uma que não fosse tão gasta. Uma da qual as palavras saíssem limpas; que fosse tão nova que viesse quase sem dentes. Uma língua em que as gengivas se balbuciassem sem sentido, de tão tenras. Uma língua mole sem a rigidez das línguas por repetição refeitas. Gostaria de uma nova língua. Uma língua de palavras que não perdessem a virgindade, uma língua que me expressasse sem clichês, sem ditados, sem frases feitas por costumes inconscientes. Uma língua que me chamasse só pelo som do meu nome e que me dissesse tanto e tudo quase sem se dizer. Uma língua que me fosse justa e íntima e cara e que trouxesse na ponta das palavras os sentidos gustativos das papilas íntimas da boca. Gostaria de uma língua lisa, cor de rosa-carne, cor de gente que não se esconde silenciada atrás dos lábios abertos que tanto dizem sem nada dizer. Gostaria de uma língua menos usada, amassada, jogada, futilizada, desembuchada. Uma língua dessas novinhas em folha, recém-nascidas, quentinhas, saídas do forno. Uma língua que soubesse colocar o sabor do saber da primeira palavra no céu da boca. Uma língua que soubesse se dizer como nenhuma outra. Uma língua dessas que se experimentam com o gosto da primeira vez. Eu gostaria de uma língua nova. Uma que viesse sem preço, sem pressa, mas com apreço. Eu gostaria. De uma língua que não pudesse cair no gosto do mercado publicitário.

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