Re(vendo-me)

Hoje já não é hoje. Hoje é ontem. Já? Já! A TV te diz isso, os jornais te dizem isso, os livros novos nas prateleiras das livrarias te gritam isso. Tudo é ontem. Eu, você, ele. Todos nós: ontens, isto é, hojes abortados. Vivemos a vida perseguindo amanhãs que nascem antes mesmo de hoje. Hoje? Hoje não existe mais. Hoje já é ontem, quantas vezes vou ter que repetir? Ontem é anteontem. E o amanhã foi agora, há poucos segundo, você não viu?
Somos a dor de termos que ser o que não somos para termos a mesma aparência deste mundo doido, frenético e de ingresso torpe. Não somos nós que usamos o mundo. É o mundo que nos usa. É do mundo a marca da roupa epitelial que nos veste a carapuça. Viramos os produtos consumidores do capitalismo. Ô, Descartes, atualize-se. Agora, pra fugir da inquisição, é “Tenho, logo, existo!”. Ter é ser e ser é ter. E assim somos: tendo. E assim temos: não-sendo. Uma inversão brutal. Uma invenção venal. E que você reflita sobre o que na sua vida é mesmo real.

 

Crédito da foto: Caleb Lucas.

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